VideBula: Abril Azul contribui para desmistificar o autismo

VideBula – Episódio 04: Compreendendo o Autismo
🎵 ABERTURA: Sobe Som 🎵
Pati: Oi, pessoal! Eu sou a Patrícia Serrão.
Raíssa: E eu sou a Raíssa Saraiva.
Pati: E esse é o VideBula, o seu podcast sobre saúde, bem-estar e acesso a direitos.
Raíssa: O Abril Azul foi estabelecido pela ONU como o mês de conscientização do Transtorno do Espectro Autista, para promover a inclusão e combater a discriminação contra pessoas que vivem essa realidade.
Pati: Esse é o tema do episódio de hoje: o autismo. E para nos ajudar a entender melhor, conversamos com Raquel Del Monde, médica formada na USP Ribeirão (1993), com residência em Pediatria pela Unicamp (1996) e treinamento em Psiquiatria da Infância e Adolescência também pela Unicamp (2013). Depois de ter seu primeiro filho diagnosticado com autismo aos oito anos, ela direcionou seus estudos e atuação para o universo do neurodesenvolvimento.
🎵 SOM DE TRANSIÇÃO
Raíssa: Raquel, para começar, você pode explicar para a gente, numa linguagem simples, o que é o autismo?
Raquel: Bom, o autismo a gente considera como uma condição do neurodesenvolvimento. Isso quer dizer que a pessoa já tem uma configuração cerebral diferente. Então ela tem um cérebro que pensa, sente, processa as informações do ambiente, os sentimentos, os estímulos sensoriais de uma maneira diferente das pessoas neurotípicas, ou seja, aquelas que têm um desenvolvimento padrão. E isso vai acabar resultando em comportamentos diferentes também. E uma coisa importante também para a gente falar sobre autismo é que ele é uma condição muito heterogênea. Então, nós temos uma variabilidade de manifestações muito grande. Tem uma frase na comunidade autista que diz: “Se você conhece um autista, você conhece um autista”. Porque realmente há manifestações diferentes, mas sempre num padrão que difere das pessoas típicas.
🎵 SOM DE TRANSIÇÃO
Pati: Existe diferença nessa manifestação entre homens e mulheres?
Raquel: Existe, e é uma coisa que hoje em dia a gente tem reconhecido cada vez mais, levando em consideração tanto no processo diagnóstico, porque as mulheres tendem a ter manifestações mais sutis do que os homens, como na questão do tratamento e da intervenção terapêutica. As necessidades das mulheres autistas, muitas vezes, são bem diferentes das necessidades dos homens autistas.
Raíssa: Elas escondem mais o diagnóstico do que os homens?
Raquel: Sim. É, na verdade, mesmo quando a gente vê mulheres com desenvolvimento típico, aquele dentro do padrão, a gente percebe que as mulheres, elas têm uma cognição social melhor do que a dos homens. Então, elas têm mais facilidade em compreender aspectos assim, da interação social, e de elaborar comportamentos que sejam mais próximos do esperado. Então, elas podem mascarar mais os sinais do autismo. Não que homens não mascarem também, mas as mulheres elas geralmente conseguem mascarar mais. Então, a gente tem um subdiagnóstico de mulheres, elas são menos identificadas e elas acabam até, por causa disso mesmo, desenvolvendo às vezes outros problemas de saúde mental, que muitas vezes é o que acaba levando elas a um consultório, né, de psicólogo, de psiquiatra, porque acabam às vezes tendo um quadro de depressão, de ansiedade, e muitas vezes acabam também recebendo diagnósticos incorretos antes de realmente serem identificadas como autistas.
🎵 SOM DE TRANSIÇÃO
Pati: A gente ouve muito que o autismo é mais comum em meninos. Mas será que essa diferença é tão grande assim ou pode estar relacionada a esse subdiagnóstico?
Raquel: É, essa é uma questão assim muito polêmica, a gente estuda bastante essa questão, porque tem a questão do subdiagnóstico, com certeza, mas a gente ainda não tem certeza se existe um componente biológico, talvez relacionado a cromossomo, né? Porque mulher tem 2 X, homem é um X só, e nós temos, assim, proteínas que influenciam no desenvolvimento do sistema nervoso central. Então, é uma questão assim bem complexa, mas com certeza a subnotificação é uma das razões que os homens assim têm um número muito maior de pessoas diagnosticadas do que as mulheres.
Raíssa: E com a mudança recente do CID 11, que unificou os diagnósticos dentro do espectro autista, como ficam os níveis de suporte? Eles ainda fazem sentido?
Raquel: Então, essa é uma confusão grande porque os níveis de suporte, eles foram propostos pela classificação americana, que é o DSM, que não é oficial no Brasil. Então, a gente acabou adotando muito porque a gente acaba seguindo, né? Profissionais do mundo inteiro acabam seguindo o DSM, que é na verdade da Associação Americana de Psiquiatria. E eles, a proposta de nível de suporte é para, em vez da gente pensar em termos de gravidade, se alguém é mais ou menos autista, que a gente entenda como a necessidade que a pessoa tem de suportes variados, né, terapêuticos, sociais, ambientais. Então seria uma maneira assim, vamos dizer, mais justa de se pensar. Mas ainda assim, três níveis de suporte não são suficientes assim para descrever toda essa variabilidade que a gente tem. E em termos assim de validade mesmo, eles não são válidos oficialmente no Brasil.
Raíssa: Os níveis de suporte do autismo ainda geram muitas dúvidas, Pati. Acho que vale a pena a gente falar mais sobre isso nos próximos episódios.
Pati: Com certeza, já vou botar na pauta! E Raquel, algo que ouvimos muito e que irrita parte da comunidade autista é a ideia de que alguém tem “autismo leve”. Por que essa expressão não é adequada?
Raquel: É engraçado porque as pessoas, justamente frente a essa heterogeneidade, as pessoas tem um desejo natural de saber “onde é que eu me encaixo?”, num espectro tão grande, que tem pessoas que falam, outras que não falam, algumas que precisam de muito apoio no dia a dia, outras que são independentes, trabalham, casam, então é meio natural que as pessoas tentem se encontrar. Então acho que a questão de níveis vem, vem assim em resposta a esse desejo. E antes mesmo de níveis, a gente falava informalmente, né? Leve, moderado e grave, então era uma maneira que a gente usava informalmente. Mas com certeza não é uma maneira também legal, porque quando a gente fala leve, a gente acaba invalidando as necessidades de um autista que tem uma menor necessidade, assim, de suporte, mas que ao mesmo tempo tem prejuízos muito grandes assim na vida, né? Inclusive a gente tem aí uma taxa de ideação suicida muito maior nesse subgrupo. Então, falar que a vivência do autismo é leve, então é uma coisa que realmente incomoda muita gente na comunidade.
🎵 SOBE SOM
Raíssa: Muito obrigada, Raquel, por trazer informações tão importantes!
Pati: E você já sabe: tem dúvidas ou sugestões de temas, manda um e-mail para videbula@ebc.com.br!
Raíssa: A gente adora saber o que vocês pensam sobre o programa.
Pati: O VideBula é uma produção original da Radioagência Nacional, um serviço público de mídia da EBC, a Empresa Brasil de Comunicação.
Raíssa: Você pode ouvir outros podcasts e séries da Radioagência Nacional no nosso site, nas plataformas de áudio e com interpretação em Libras no Youtube.
Pati: O podcast é idealizado e apresentado por mim, Patrícia Serrão, e por Raíssa Saraiva. A edição é de Bia Arcoverde. Na operação em Brasília Thiago Coelho, e no áudio e sonoplastia no Rio, Toni Godoy.
Raíssa: Para mais informações, VideBula! Até o próximo episódio!
🎵 SOM DE ENCERRAMENTO